Iniesta e o gol que o colocou na história do futebol espanha. Após bater na trave várias vezes, a Espanha é campeã do mundo (AP)
Iniesta pega a bola, falta. Xavi é acionado, falta. Pedro recebe um passe, falta. Xabi Alonso domina... bem, você já sabe. A Holanda abusou das faltas contra a Espanha. Foram 28, algumas delas bastante violentas. Mas isso não foi um retrato de uma equipe descontrolada ou desesperada. Era uma estratégia de jogo. Pode não ser a mais louvável, mas é algo permitido pela regra. E, a bem da verdade, ela até foi bem sucedida do ponto de vista defensivo. O problema é que serviu para tirar os próprios holandeses da partida.
Bert van Marwijk é um técnico inteligente, que conhece futebol, está determinado a levar seu time à vitória e sabe como fazer o elenco se unir em torno de uma ideia. Foi assim que fez a Holanda jogar focada no Mundial – e perder o foco é um antigo vício das seleções holandesas – e priorizar a vitória à beleza do jogo. Na final, ele sabia que as chances laranjas aumentariam se o time quebrasse a posse de bola da Espanha.
Para viabilizar sua estratégia, os holandeses fizeram duas coisas: congestionaram o setor de armação da Espanha, tirando espaço para movimentação, e partiram para uma marcação agressiva, atacando como fosse possível quem estivesse com a bola. Quando o desarme não se concretizava, uma “falta tática” era bem-vinda. E assim a Holanda não teve pudor em derrubar Iniesta, Xavi, Pedro, Xabi Alonso...
Funcionou parcialmente. A Espanha não conseguiu impor tanto sua posse de bola, sobretudo no primeiro tempo e em parte do segundo. Alem disso, os ibéricos ficaram irritados com as faltas sofridas e eles próprios fizeram das suas. Os lances ríspidos tornaram o jogo interessante pela tensão. A qualquer momento, um time poderia perder a cabeça e atirar pela janela o título.
Mas os espanhóis estavam mais conscientes do que era preciso fazer para vencer a partida. Os holandeses, não. No desejo de anular o oponente a qualquer custo, a Holanda não tinha opções de ataque. A única estratégia era lançar Robben e torcer para o meia-atacante conseguir um gol em jogada individual. Duas vezes o jogador ficou na cara de Casillas, mas não dá para dizer que os laranjas estavam realmente construindo algo.
O pior é que, atrás, o sistema defensivo foi trincando aos poucos. De tantas faltas cometidas, muitas delas desleais, a Holanda ficou carregada de cartões amarelos (sete, seriam mais se Howard Webb estivesse mais rigoroso). Sob o risco de perder jogadores, Van Marwijk tirou nomes importantes como De Jong e Van Bronckhorst e abriu espaço, pois teve de improvisar Van der Vaart como volante e usar o inexperiente Braafheid.
O que era um jogo tenso e travado se transformou em domínio espanhol, ainda mais depois da expulsão de Heitinga. Claro, continuava faltando mais poder de decisão dos ibéricos. Villa não conseguia receber em condições de finalizar, Iniesta e Xavi hesitavam antes de um arremate, Navas só caía pela ponta e Fernando Torres fazia falta na frente. Mas a Espanha já era hegemônica e o gol poderia sair a qualquer momento.
E saiu. Justamente onde a Holanda se fragilizou. Aos 12 minutos do segundo tempo da prorrogação, Jesús Navas avançou pela direita, onde Braafheid deixava espaço, tocou para o meio, onde Iniesta e Fábregas articulavam sem o combate de um volante (Van Bommel virou zagueiro para tapar o buraco deixado por Heitinga e Van der Vaart não tem intimidade com a função). Da troca de passes, Iniesta recebeu na cara do gol, e chutou no canto direito de Stekelenburg.
A Espanha não teve sua noite mais inspirada, até porque expôs nervosismo e tensão. Ainda que o placar e o sofrimento da decisão não retrate a diferença técnica entre as equipes, o título foi merecido. E quem mais demonstrou isso foi a Holanda com sua estratégia defensiva. Pois há elogio maior do que o medo do adversário?
*Contribuição de Victor Mendes.
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