quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

José Mourinho e os casos de nacionalismo exacerbados

José Mourinho provoca. Dessa vez ele não teve culpa (reuters)

Com as festas de final de ano se aproximando, a Liga BBVA dá uma pausa e entra num recesso de duas semanas. A próxima rodada a ser disputada é apenas no dia 8 de janeiro - nos dias 4 a 5 serão disputados os jogos da Copa do Rei. Para que as atividades do Quatro Tiempos não pare, nada mais justo do que relembrar uma das polêmicas da temporada 2011/2012. E, obviamente, ela não poderia vir de outra pessoa a não ser José Mourinho.

Após a vitória do Real Madrid ante o Espanyol, na 6ª rodada, um repórter que cobria o clube périco fez uma pergunta em catalão para José Mourinho. O técnico pediu para responder em espanhol. Até aí, tudo tranquilo. Até um jornalista estrangeiro fazer uma pergunta em inglês e ter uma resposta em inglês. Pronto: indignação entre os catalães. Por que os ingleses recebem resposta em seu idioma e os catalães não?

José Mourinho adora criar picuinha, adora transformar coisas minúsculas em acidentes diplomáticos irreversíveis. Mas, nesse caso, fica a sensação de que a imprensa quis criar um problema que não existia. Com a solidificação de alguns líderes políticos catalães e a crescente rivalidade entre Barcelona e Real Madrid, a Catalunha começa a viver um clima em que abraçar o catalanismo se torna obrigação. Durante décadas, manter a língua catalã era uma maneira de resistir à dominação castelhana e manter a identidade regional. A cada vitória blaugrana em um superclássico, o povo se enche de orgulho e se sente superior à capital. É como se, exagerando, o Futbol Club Barcelona fosse o motor e o coração de toda uma região. É com ele que, a cada título, os catalães se sentem independentes e o centro do mundo passa a ser a Catalunha, pacificamente a praça de Sant Jordi.

Jovens pró-independência: os "caras-pintadas" da Catalunha (reprodução)

Um processo valioso. Mas, agora, há momentos em que se extrapola. Passa a haver uma exigência de expor isso a todo momento, como se fosse mostrar a força catalã diante do resto do país. Os catalões, que até hoje brigam por uma independência, se consideram uma nação dentro de outra. Possuem uma cultura diferenciada, língua própria e soberania política. O idioma catalão é uma mescla do castelhano com o francês. Mas eles também falam espanhol com o turista. O barcelonense típico não gosta de ser chamado de espanhol. É catalão e ponto final. A própria Polícia Nacional espanhola, em processo gradual, se retirou do território catalão, cedendo lugar aos Mossos d’Escuadra, peculiaríssima designação da polícia local, fundada no nome de uma milícia catalã de dois séculos atrás. Para muitos catalães, porém, esse grau de autonomia parece muito pouco. Em tudo e por tudo, quando se trata da Catalunha se fala em “nação” ou de algo “nacional”. Há em Barcelona um Museu Nacional da Arte Catalã, e um Museu Nacional da História da Catalunha

Esse tema, complicado, já chegou à seleção espanhola. Em uma coletiva, há pouco mais de um ano, a imprensa catalã pediu para Piqué dar uma resposta em catalão. O zagueiro concordou, mas diplomaticamente perguntou se ele próprio se encarregaria de fazer a tradução para o espanhol. Sergio Ramos, que também participava da entrevista, se irritou com a atitude do jornalista e sugeriu ao colega de defesa a traduzir para o andaluz. Nenhum jornalista basco, andaluz, valenciano ou galego fez pergunta na língua de sua região.

Até quem não é catalão já sofreu com isso. Em 2006, quando defendia o Barcelona, Eto’o não entendeu uma pergunta feita em catalão. Foi repreendido pela direção do clube, que disse que providenciaria aulas para o atacante (que aprendeu espanhol quando defendeu o Real Madrid, ainda adolescente). Durante os Jogos Olímpicos de 2008, Rafael Nadal também não compreendeu uma pergunta feita em catalão. Um líder político nacionalista o acusou de não ter consideração com a Catalunha e os jornalistas catalães. Detalhe: o tenista nasceu nas Ilhas Baleares, onde o catalão também é idioma oficial, mas menos difundido que na Catalunha, e só se mudou para Barcelona aos 14 anos. Se Eto’o e Nadal foram morar na Catalunha quando já eram fluentes em espanhol, é cabível que não tenham precisado aprender a língua regional.

A relação dos catalães com a seleção espanhola é dúbia. A maior parte da região torceu pela Fúria na Copa de 2010, mas demonstrar isso poderia levar à discriminação. Por isso, muitos ficaram quietos, ou comemoraram o título com comedimento. Os jogadores catalães da seleção têm de lidar com essas pressões a todo momento. Afirmam e reafirmam o comprometimento com a Espanha, ao mesmo tempo em que afirmam e reafirmam o apego ao catalanismo. Josep Guardiola é o maior exemplo disso. Entusiasta da região espanhola, defendia a criação de uma seleção nacional de futebol catalã, além de fazer questão de comemorar diversos títulos enrolado em uma bandeira da Catalunha.

No geral, o grupo de Vicente Del Bosque mostra um grande desprendimento e compreensão de como é preciso agir com inteligência para aproveitar o momento. Os catalães Xavi, Busquets, Fàbregas, Valdés, Piqué e Puyol formam a melhor seleção nacional dos últimos anos quando se juntam a Xabi Alonso (basco), Javi Martínez (navarro), Casillas (castelhano), Iniesta (manchego), Sergio Ramos (andaluz), David Silva (canário) e David Villa (asturiano). E só passando por cima dos atritos Barça x Madrid criados por Mourinho ou do nacionalismo incitado por parte da imprensa catalã para isso.

4 comentários:

  1. Realmente é muito chato o fato dessa discussão vir a tona a todo momento. Não quero discutir política, os catalães devem ter suas razões, mas ficar usando o FC Barcelona para se auto promover é oportunismo demais... Esporte com politicagens não é nada legal.

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  2. Aí é questão de opinião, apesar de eu concordar com você.
    Abraço!

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  3. Procede as especulações(antigas) de que Pep Guardiola irá assumir a Fúria?

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